Crítica | Todos os Musicais de Chico Buarque em 90 minutos

Oh, pedaço de mim

Oh, metade arrancada de mim

Leva o vulto teu.

Que a saudade é o revés de um parto

A saudade é arrumar o quarto

Do filho que já morreu.

O mais novo musical da famosa dupla Charles Möeller e Claudio Botelho chegou em uma nova era dos musicais no Brasil. Depois de uma longa temporada de musicais nacionais biográficos, temos um novo musical original. Como o próprio nome já diz, este une várias canções de musicais e trilhas sonoras do grande Chico Buarque. A Ópera do Malandro, A Gota d'Água, entre tantos outros, emprestam algumas de suas clássicas canções em uma nova roupagem para as cenas primorosamente desenhadas por Möeller e Botelho.

O texto escrito pela dupla é maravilhoso. Trata-se da história de uma companhia de teatro mambembe, cheia de amores proibidos, passagens cômicas e que sofre um grande rebuliço com a chegada de uma linda e misteriosa nova atriz, o que gera um conflito dentro da cia. e novos questionamentos entre os personagens.

As canções de Chico são inseridas com uma precisão cirúrgica, minuciosamente atreladas à trama como se tivessem sido escritas para o próprio musical. É claro, acompanhadas de performances arrebatadoras e tocadas em arranjos que flertam com o suave e o intenso. Mais "Chico", impossível.

Enquanto as prostitutas, os malandros e as mulheres plurais fazem parte dos musicais originais de Chico, aqui esses papéis são genialmente divididos entre o elenco da companhia teatral, algo muito bem pensado e que tem um efeito ótimo.

Voltando a falar das músicas, destaque para as maravilhosas "Beatriz" que torna-se um canto angelical nas vozes de Malu Rodrigues e Lua Blanco (com um toque sutil e encantador do próprio Botelho, que dá um show como o dono da companhia); "Palavra de Mulher", numa apresentação arrebatadora de Lilian Valeska; "Gota d'Água" na voz e interpretação incríveis de Soraya Ravenle que arrepia até a alma; e a maravilhosa "Pedaço de Mim", que na opinião deste que vos fala é uma das mais belas canções da nossa música, numa interpretação apaixonada de todo o elenco.

Elenco este que é maravilhoso, vale citar. Cada um interpreta muito além dos limites do seu personagem, como grandes pássaros rompendo a casca de seus ovos e alçando vôos assombrosos, algo que o texto e direção permitem, e tem um resultado de cair o queixo. Todos, sem exceção. Vozes maravilhosas, interpretações incríveis. Maravilhosamente amarradas a um texto genial e músicas imortais.

Todos os Musicais de Chico Buarque em 90 minutos é um musical digno dos grandes palcos do mundo. E eu estou na torcida para que um dia ele chegue a outros cantos do mundo. Quem sabe um dia chegue até à Broadway? Seria mais do que merecido.

A música é uma linguagem universal. O amor é um sentimento universal. E como falar de música e amor, sem pensar em Chico Buarque?